quinta-feira, 24 de março de 2011

Inside Job - ou como a bomba nos explodiu nas mãos

Finalmente! Caiu o papão... o animal feroz, o mentiroso! Aleluia! Até que enfim, vem aí o FMI, por culpa dele claro, e eleições que já tinha saudades, por culpa dele, claro. Vem aí um governo diferente, que vai aplicar com orgulho as medidas de Merkel, que vai acabar com a justa causa de despedimento, que vai pôr toda a gente a recibos verdes, que vai recuar 30 anos nas leis laborais, que vai despedir 20.000 funcionários públicos, a mando do FMI claro, que vai cortar entre 10% a 20% nos salários, a mando do FMI obviamente, que vai pôr o país na ordem, que eles é que são bons, e com a crise podem eles, que os outros é que tiveram culpa da maior crise desde 1929, agora é que vai ser...explodiu a bomba e o país fica para depois.

Eis o que vi e ouvi no dia de ontem...demissão de Sócrates incluída.
Assisti incrédulo à seguinte afirmação por parte de Miguel Macedo, líder parlamentar do PSD: "O PSD não chumbou as medidas do PEC, o PSD chumbou a credibilidade do Governo."
Antes disto, numa nota em inglês para os seus homólogos de Bruxelas, o PSD, entre outras disse: "é preciso atacar a base de apoio de funcionários públicos do PS".
Vi a intervenção na AR de M. Ferreira Leite. Tive vontade de rir, mas não consegui, só conseguia visualizar a austera  Ministra das Finanças de Durão Barroso. Tentei lembrar-me de alguma medida de mérito que ela tenha tomado, de alguma obra que ficasse, de redução do défice, de redução da despesa, etc. Não consegui. Lembrei-me então de quando ela era Ministra da Educação. Definitivamente não consegui sequer esboçar um sorriso.
Então, com muito esforço, tentei lembrar-me de alguma coisa que Cavaco tenha dito para, com a sua magistratura activa, tentar pôr ordem nos rapazolas que estavam a brincar aos governos de um país endividado. E não é que o homem não disse nem fez nada?!?!
Tentei lembrar-me de alguma ideia, medida ou letra de canção a roçar o foleiro mas com epíteto de intervenção, que o PSD tivesse sugerido...nada.
Vi que ninguém quis saber do apoio e aplauso de todas as instituições europeias às medidas constantes do PEC IV, que, como é imposto por estas vão mergulhar o país numa crise ainda pior.
Pensei que Sócrates devia estar mesmo agarrado ao poder, demitindo-se quando a isso não era obrigado, mas sentindo que não lhe davam condições mínimas de estabilidade para continuar a  governar.
Mais tarde, já com muito sono, deu-me para tentar imaginar o que é que PSD e CDS poderiam fazer de diferente, e acordei com Passos Coelho a dizer que já está a pensar aumentar o IVA.
Como é possível brincar assim com o país, principalmente com  um golpe vindo de dentro (Inside Job). Como se não bastasse o maravilhoso sistema em que a União Europeia se deixou amordaçar, em que a agências de rating Fitch, Moody's e Standard and Poor's, baseadas nos Estados Unidos da América (onde havia de ser?) controlam as políticas fiscais, económicas e sociais dos Estados-Membros da União Europeia através da atribuição das notações de crédito.


"Aníbal António Cavaco Silva, agora Presidente, mas primeiro-ministro durante uma década, entre 1985 e 1995, anos em que estavam despejando bilhões através das suas mãos a partir dos fundos estruturais e do desenvolvimento da UE, é um excelente exemplo de um dos melhores políticos de Portugal. Eleito fundamentalmente porque ele é considerado "sério" e "honesto" (em terra de cegos, quem vê é rei), como se isso fosse um motivo para eleger um líder (que só em Portugal, é) e como se a maioria dos restantes políticos (PSD/PS) fossem um bando de sanguessugas e parasitas inúteis (que são), ele é o pai do défice público em Portugal e o campeão de gastos públicos.
A sua "política de betão" foi bem concebida, mas como sempre, mal planeada, o resultado de uma inepta, descoordenada e, às vezes inexistente localização no modelo governativo do departamento do Ordenamento do Território, vergado, como habitualmente, a interesses investidos que sugam o país e seu povo.
Uma grande parte dos fundos da UE foram canalizadas para a construção de pontes e auto-estradas para abrir o país a Lisboa, facilitando o transporte interno e fomentando a construção de parques industriais nas cidades do interior para atrair a grande parte da população que assentava no litoral.
O resultado concreto, foi que as pessoas agora tinham os meios para fugirem do interior e chegar ao litoral ainda mais rápido. Os parques industriais nunca ficaram repletos e as indústrias que foram criadas, em muitos casos já fecharam. Uma grande percentagem do dinheiro dos contribuintes da UE vaporizou em empresas e esquemas fantasmas. Foram comprados Ferraris. Foram encomendados Lamborghini. Maserati. Foram organizadas caçadas de javali em Espanha. Foram remodeladas casas particulares. O Governo e Aníbal Silva ficou a observar, no seu primeiro mandato, enquanto o dinheiro foi desperdiçado. No seu segundo mandato, Aníbal Silva ficou a observar os membros do seu governo a perderem o controle e a participarem. Então, ele tentou desesperadamente distanciar-se do seu próprio partido político. E ele é um dos melhores (...) Depois de Aníbal A. Cavaco da Silva veio o bem-intencionado e humanitário, António Guterres (PS), um excelente Alto Comissário para os Refugiados e um candidato perfeito para Secretário-Geral da ONU, mas um buraco negro em termos de (má) gestão financeira. Ele foi seguido pelo diplomata excelente, mas abominável primeiro-ministro José Barroso (PSD) (agora Presidente da Comissão da EU, "Eu vou ser primeiro-ministro, só que não sei quando") que criou mais problemas com seu discurso do que ele resolveu, passou a batata quente para Pedro Lopes (PSD), que não tinha qualquer hipótese ou capacidade para governar e não viu a armadilha.
Resultando em dois mandatos de José Sócrates; um Ministro do Ambiente competente, que até formou um bom governo de maioria e tentou corajosamente corrigir erros anteriores. Mas foi rapidamente asfixiado por interesses instalados.
Agora, as medidas de austeridade apresentadas por este primeiro-ministro, são o resultado da sua própria inépcia para enfrentar esses interesses, no período que antecedeu a última crise mundial do capitalismo (aquela em que os líderes financeiros do mundo foram buscar três triliões de dólares de um dia para o outro para salvar uma mão cheia de banqueiros irresponsáveis, enquanto nada foi produzido para pagar pensões dignas, programas de saúde ou projectos de educação)."
Timothy Bancroft-Hinc in "Pravda", jornal russo, esta semana, sobre Portugal.


Post Scriptum - Aconselho vivamente o documentário sobre a crise internacional "Inside Job".


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