quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Sentimento de culpa

A luta pelos nossos direitos equivale a lutar pelo nosso futuro, mas sobretudo pelo dos nossos filhos.
Quando nos dizem que é preciso empobrecer porque andamos anos a fio a viver acima das nossas possibilidades, é também necessário que nos expliquem porque é que o país andou a ser governado anos a fio com défice em cima de défice e dívida em cima de dívida, empurrando com a barriga aquilo que outros comiam com os olhos.
Quando nos dizem que temos que cortar tudo a todos, doa o que doer, é também preciso que nos expliquem porque nos vendem os centros decisores e estratégicos do país em leilões mais ou menos duvidosos, hipotecando o futuro em rendas e lugares pagos a peso de ouro.
Quando nos dizem que é preciso refundar o estado social porque não se sustenta a si próprio, é também obrigatório que nos digam porque falhou em toda a linha a execução orçamental e porque é que a banca continua a obter lucros sensacionais em época de crise. É preciso que nos digam porque é que a quinta avaliação da troika nos colocou ao nível grego e agora exige os cortes na despesa que já deviam estar feitos e porque é que o empréstimo que nos dão só serve para pagar juros e alavancar o sistema bancário de casino.
Quando nos dizem que a austeridade é o caminho e um fim em si mesmo, é urgente que nos expliquem porque é que a dívida e o défice continuam a aumentar. Porque é que a banca continua desregulada e porque é que apenas se aplicam as medidas 'fáceis' de aumento de impostos.
Quando nos dizem que todos somos culpados da crise, é também necessário que nos expliquem porque é que aumentaram salários acima da inflação, porque aumentaram impostos a um nível que só facilita a fuga ao fisco e a quebra de consumo, a recessão e os truques contabilísticos com os fundos de  pensões. Que nos digam porque é que as populações hão-de pagar a deslocação centralista dos tribunais e da justiça, que contas feitas ainda sai mais caro ao estado, porque é que se permite que se aposte nos casinos da banca com o dinheiro da segurança social que perdeu milhões para os Ulrich's do sistema. 
Quando nos dizem que a maratona vai a meio, que nos expliquem porque é que não se removem os obstáculos, em vez de zigue-zaguear ao som do que se ouve na rua, em vez de parar para pensar, em vez de deixar que sejam sempre os mesmos a empobrecer.
A verdade é que somos todos culpados, que vivemos acima das nossas possibilidades, que permitimos tudo, festejamos com o que não tínhamos, com o euro e por causa dele, mas perdoar-me-ão, uns são mais culpados do que outros... não me importa agora saber quem é mais culpado, começando lá fora em Reagan e acabando no recém eleito flop Obama, e cá dentro começando em Cavaco e até hoje todos tiveram a sua quota-parte.
A democracia está doente, o capitalismo selvagem continua o seu assalto, e quem tem responsabilidades é que o permite, por todo o lado.
Porque não nos explicam que a banca apesar de ser um sector fundamental é dos sectores que mais contribuiu para a crise actual, desde a desregulação do século XX, com gestores que apenas visavam os dividendos e os prémios, apostando tudo desde seguros a casas e contra eles próprios, da crise do subprime à crise das dívidas soberanas que os vieram salvar por causa da cláusula 'too big to fall'. Que foram os partidos e os governantes que permitiram a ascensão e a queda dos derivados e que permitem que tudo continue na mesma.
Porque não nos explicam que foram os sucessivos erros e má governação que permitiram PPP's usurárias para o estado, em que o lucro era para as empresas amigas e os riscos para o contribuinte, feitas com pareceres milionários e prémios pornográficos para os do costume.
Porque não nos explicam porque só cortaram três fundações e zero empresas municipais.
A culpa do cidadão eleitor e contribuinte está a ser expiada, a dos outros vamos exigi-la na rua, para o bem ou para o mal. Já chega!!! E não me venham depois dizer que o país é ingovernável, se o for a culpa não é minha...

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