quinta-feira, 21 de junho de 2012

Da Justiça [6] - Sim, sra. ministra!

Para quem é jurista, a entrevista que a ministra da Justiça deu ontem na televisão é um verdadeiro achado. E se não fosse triste tinha sido muito cómica. Dissertou sobre várias questões, desde o novo mapa judiciário até aos julgamentos em processo sumário de todos os crimes em que o seu autor seja apanhado em flagrante delito.

Sobre o novo mapa judiciário insistiu várias vezes no aspecto do ganho de novas especializações onde antes não havia. Na questão do fecho de tribunais, sobejaram razões de ordem de eficácia, eficiência e optimização, sublinhando sempre que ninguém perderá o emprego. Ora, nesta questão, o que verdadeiramente está por trás disto, é obviamente uma razão economicista. A ministra esquece-se, convenientemente e frequentemente, dos princípios gerais do direito, orientadores do Estado de Direito em que ainda vivemos, assim como os princípios gerais de natureza criminal, orientados numa perspectiva de proximidade, em que os crimes devem ser julgados na área territorial onde tiveram lugar, por forma a dar publicidade à população, numa razão de proteger e atingir a concussão dos fins de prevenção gerais das penas. É no sítio onde ocorreu o crime que mais necessidade existe de assegurar a prevenção de futuros crimes, e é precisamente nesse lugar, onde se desenvolve todo um caminho, iter criminis, que põe muitas vezes em sobressalto as comunidades, que mais facilmente se dá conhecimento ás populações de que não existe crime sem castigo. Mesmo até numa perspectiva de investigação criminal, onde a vizinhança costuma ser 'boa conselheira'.

Esquece também a sra. ministra, que no caso dos crimes que são julgados em tribunal colectivo, de pena, abstractamente aplicável, superior a 8 anos de prisão, ou nos casos de acções ordinárias, isto é, de valor superior a 30 mil euros, que os tribunais competentes, na sua maioria, passarão a ser julgados na capital de distrito. Ora, está mais que visto, que a sra. ministra não conhece Portugal, e não conhece o funcionamento dos tribunais. Ex: existem no concelho de Montalegre aldeias que se situam em pleno Gerês. Um julgamento dessa natureza, implica deslocações a Vila Real de 10, 20 ou mais testemunhas, com pelo menos duas horas de caminho, pagamento de portagens, e outros custos, nomeadamente, transporte, almoço, se o julgamento continuar de tarde, e/ou se não for adiado por qualquer situação, coisa banal nos nosso sistema judicial.

O novo mapa judiciário, mais uma vez, é feito contra as populações do interior, feito a régua e esquadro num qualquer gabinete de 'Lesboa', sem auscultação ou estudo no terreno, e que fará a Justiça afastar-se ainda mais do cidadão... e este daquela.

Quando questionada se um homicida apanhado em flagrante delito poderia ser julgado num prazo de 48 horas e em processo sumário, com apenas um juiz, a ministra disse e bem, que o arguido sempre poderia pedir prazo para defesa, que poderiam haver perícias a efectuar, ou até o próprio juiz se assim entendesse, por julgar o caso de excepcional complexidade, poderia remeter o caso para processo comum. Pergunta imediata: então para que serve a alteração nestes casos? Ficou sem resposta...

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