quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Um pouco mais de esquerda

O calor de Verão naquele dia de Agosto era um fogacho do que se esperaria. E como o tempo é sempre um óptimo desbloqueador de conversa, quebrei o gelo referindo que o Verão naquele dia se tinha escondido. "Os comunistas é que deram cabo disto tudo!" - recebi como resposta. Ora, não sendo comunista, ainda assim percebi que a resposta não se limitava ao estado do tempo em particular, mas a tudo de um modo geral, e não consegui disfarçar um sorriso irónico. No entanto, nada disse.
Como explicar a um homem emigrado nos EUA há mais de 50 anos, que vive o sonho americano, que a coisa não era bem assim?! Como explicar-lhe que os EUA são dos poucos países que se recusaram a assinar os acordos de Quioto? Como explicar que foram as políticas liberais de Thatcher, Reagan, Bush pai e do idiota do Bush Jr. que permitiram a total desregulação do sistema financeiro e levaram ao rebentar da 'bolha'. Com as consequências que se conhecem. Como explicar que foram os especuladores 'agiotas' de colarinho branco que destruíram a economia ocidental, em nome dos mercados e da livre iniciativa de mão invisível. Como explicar que são os mesmos ainda que se propõem resgatar os estados, reféns das suas políticas de austeridade, urdidas em conselhos de administração de empresas que têm ministros e o FMI em speed dial. Como explicar que continuam a ser os mesmos a ditar (do verbo diktat) a maneira como serão os contribuintes e os trabalhadores a pagar o colapso do sistema por eles implodido e que agora pretendem reformar com mais do mesmo, impondo cartilhas liberais a cegos discípulos cheios de tesão, inebriados por uma falsa sensação de poder, cada vez menos legitimados (sim, agora estou a falar do 'conselheiro' Borges). Como explicar que o país mais 'democrat' do mundo, considera eleger para presidente outro idiota (Romney) do género Bush Jr. Será coincidência que todos os referidos venham dos católicos republicanos, que representam uma América contra o aborto, mesmo em caso de violação ou má formação, a favor dos lobbies, dos cidadãos armados até aos dentes, da política externa baseada no petróleo e na mentira e na guerra para o conseguir, num mapa geoestratégico de interesses, de perseguição e de intolerância só comparada com a dos terroristas, numa política fiscal de favorecimento dos mais ricos e proteção dos mais influentes (para o bem ou para o mal), no óbvio reforço do sector militar, na política de saúde do pagador/utilizador, estilo comparar pessoas com scut's (tens dinheiro e seguro vives, não tens morres). Como explicar que 50% de americanos do país com mais estúpidos por m2 não percebe nada disto, nem quer, ferrados no patriotismo bacoco de melhor nação do mundo, com uma arma na mão e uma bandeira na outra.
Obama será melhor? É, mas não muito. É confrangedor ver que a nação mais poderosa do mundo (até a China lhe apetecer) só tem uma visão, de direita ou de  imbecil direita (a China não é uma democracia, por isso não conta para este cálculo), olhando de soslaio uma visão mais social e igualitária da sociedade, assente no individuo, na equidade e na redistribuição. Quem assim pensar leva com o rótulo de comunista, o pior insulto que se pode dirigir a um americano, como tentam insinuar com Obama, que instituiu a saúde gratuita para quem não puder pagá-la. Mais ou menos o contrário do que acontece hoje em dia em Portugal, seguindo uma ideologia deliberadamente assente na desforra do liberalismo sobre a doutrina social, abdicando da soberania dos estados, da proteção social na saúde e no trabalho, rasgando décadas de luta e de evolução.
Um pouco mais de esquerda, e um pouco menos de direita cá e lá e podia ser que os sacrifícios e a crise não doessem tanto... A crise começou lá e continua por cá!

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