quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Por esse rio abaixo

Desde que a crise financeira nos bateu com toda a sua força, a partir de 2010, a maioria dos cidadãos viu os seus rendimentos diminuírem, tanto cá, como na generalidade dos países. Foram cortados salários, pensões e reformas, os impostos aumentaram em catadupa e os serviços públicos viram a sua operacionalidade reduzida e em muitos casos extinguida. Assim o exigiu a política seguida, chamada de austeridade, através da qual se pagou a dívida privada do sistema financeiro em ruínas e os juros galopantes da dívida pública.
A austeridade funciona? Certamente que sim, dependendo dos objetivos, pelo que olhemos para os resultados.
“Mais de 80% da riqueza criada no mundo em 2017 foi parar às mãos dos mais ricos que representam 1% da população mundial, refere um relatório da organização não-governamental Oxfam, (…)
O estudo calculou que a riqueza dos multimilionários aumentou 13% ao ano em média desde 2010, seis vezes mais do que os aumentos dos salários pagos aos trabalhadores (2% ao ano).
Para a organização não-governamental, o crescimento sem precedentes do número de bilionários não é um sinal de uma economia próspera, mas um sintoma de um sistema extremamente problemático, já que mais de metade da população mundial tem um rendimento diário entre 2 e 10 dólares (entre 1,6 euros e 8,1 euros). 
“Enquanto o 1% mais rico ficou com 27% do crescimento do rendimento global entre 1980 e 2016, a metade mais pobre do mundo ficou com 13%”.
Dado que o dinheiro não se evapora, só ficará surpreendido com este resultado quem não quiser ver. A austeridade funcionou muito bem como forma de concentrar a riqueza num grupo muito restrito.
Na corrida para a liderança do PSD, houve uma discussão sobre “ideologia” que me pareceu colocada em termos equivocados. Parece que há quem ache que o PSD deve voltar a ser “social-democrata”.
Ninguém duvida de que o PSD, com Passos Coelho na liderança, foi diferente (mais à direita) do PSD tradicional. Mas nunca no seu passado o PSD foi social-democrata, não o foi com certeza nas épocas de Cavaco Silva e Durão Barroso, tirando talvez na época de Sá Carneiro, em que o então PPD/PSD tinha nascido com uma matriz de esquerda. 
O partido que em Portugal tem aplicado políticas social-democratas é o PS. Social-democracia é centro-esquerda, coisa que o PSD nunca foi. Durante a liderança de Passos tivemos uma direita assumida e orgulhosa de o ser. Todas as medidas que marcaram o seu mandato tinham um propósito ideológico: diminuir drasticamente a presença do Estado na sociedade portuguesa, através de privatizações e cortes. A arma era a austeridade que tão bom resultado deu, como se viu acima, e como por estes dias se comprova o seu contrário.
O que causa a diferença entre o PSD de Passos e o PSD a que estávamos habituados não é a falta de ideologia – é talvez o excesso, e de que Rio é um claro apoiante. O PSD tem de decidir se quer mais ou menos ideologia, mas se optar por mais ideologia não será com certeza para ser parecido com o PS. Aliás, aquilo de que me lembro de Rui Rio como autarca, era o seu autoritarismo e desprezo por tudo o que fosse mundano e das artes. Lembro-me da quase venda do Coliseu do Porto à IURD, sim essa que alegadamente terá ‘desviado’ umas criancinhas.


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