sexta-feira, 17 de junho de 2011

A Europa populista

A crise das dívidas soberanas da Europa – é curioso e tem piada chamar-se soberana à dívida e não aos países – desmascarou toda a farsa que esteve na origem da criação da moeda única (o Euro). Resumidamente, prometeu-se o enriquecimento súbito acompanhando o consequente desenvolvimento exponencial, uma moeda estável e taxas de juro sempre baixas, aumento de competividade e a possibilidade da conquista de mercados internacionais. O BCE garantiria a estabilidade dos preços e o famoso pacto de estabilidade impunha a regra dos 3% de máximo autorizado de défice público em relação ao PIB. Tudo isto, desacompanhado de um mecanismo de resolução de crises, confiando no princípio naif de que não há incumprimento nem resgate, deixando escancarada a porta a uma possível crise, que sem qualquer gestão ou controlo se tornaria incontrolável. Alie-se a isto a falta de uma política fiscal em comum e desequilíbrios macro económicos mais que evidentes entre os vários membros, mais um sistema bancário desregulado e temos nas mãos uma bolha prestes a rebentar.

O que começou por ser um problema dos privados, bancos e seguradoras - primeiro nos E.U.A. e que depois se alastrou à zona Euro, por tabela globalizada - rapidamente se transformou num problema dos Estados. A primeira resposta da UE para a crise foi o ‘salve-se quem puder’. Cada um resgataria os seus próprios bancos (BPN e BPP no caso português). Mais tarde, a segunda resposta, austeridade. Se tivessem criado o tal mecanismo de resgate para o sistema financeiro comum, a UE conseguiria limitar os danos aos privados e centrar-se na única crise orçamental que tinha pela frente: a Grécia. O principal erro foi considerar-se a dívida pública excessiva como principal problema, em vez de se ir ao cerne da questão, ou seja, os bancos insolventes e desregulados que estiveram na origem dessa crise. Veja-se como no plano da Troika para Portugal, 1/3 do dinheiro que nos vão emprestar servirá para recapitalizar o sistema bancário. Enquanto não se separar a dívida nacional do sistema financeiro, a crise europeia manter-se-á até o default em série dos países membros se tornar incontornável. Se não se reconhecer isto de uma vez por todas, se não se disser aos privados que o risco é por conta deles, se não se regular e reordenar o sistema bancário e financeiro, então a união monetária está condenada ao fracasso. Pelo menos em relação aos mais pequenos, aliás como é normal.

As reacções à austeridade estão aí, grupos anárquicos, extremistas e revolucionários. Acampamentos de protesto. Movimentos nas redes sociais e afins. Corrupção na política. E depois... violência, racismo, xenofobia e populismo, sobretudo populismo. Por toda a Europa podemos assistir a este tipo de movimentos. E por toda a Europa a extrema direita ganha adeptos e deputados. O populismo é a arma de mais fácil arremesso como resposta ao dramatismo actual, ‘o medo colectivo’, ‘a nossa protecção’, ‘a invasão da nossa terra’. A modernidade actual, consumista e egoísta, é intrinsecamente antidemocrática. Os grandes grupos de interesses pessoais que emergem na cena política recorrem frequentemente ao populismo, revelando uma nítida impaciência em relação à democracia, que exige consenso e compromisso. O populismo exige um bode expiatório. A suspensão do Acordo de Schengen na Dinamarca, na Itália de Berlusconi o ‘inimigo’ são os juízes, os comunistas e os imigrantes refugiados africanos que se deixam morrer no mar alto, para a Liga do Norte são os habitantes preguiçosos do sul, para a direita húngara coligada com a extrema direita são os ciganos e os intelectuais, para a direita francesa de Sarkozy e Le Pen são os ciganos, os imigrantes e os jovens suburbanos, na Escócia, na Bélgica e na Espanha temos os separatistas...

Desde o nazismo à Jugoslávia não faltam exemplos no século XX... A Nova Ordem Mundial vai nascer ainda neste século. Temo que a sua génese possa ser muito violenta.

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