segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Terrorismo tablóide

O terrorismo é a forma mais cobarde de se fazer a guerra. Até porque essa guerra é sempre ilegítima, se que alguma é legítima. Mas a forma como o jornalismo de hoje tenta influenciar a opinião pública roça a indecência. Os media, na sua maioria privados, respondem tão só aos números das tiragens, das vendas e dos lucros. Os pseudo-jornalistas que grassam nessa amálgama sem escrúpulos são capazes de tudo e do seu contrário sem qualquer crivo jornalístico ou de interesse público. As capas do Correio da Manhã são o exemplo acabado desse jornalismo de sarjeta. E o que é deveras preocupante é que seja o jornal (tablóide) mais vendido em Portugal. O que é deveras preocupante é que uma grande parte dos portugueses pense e diga convictamente o que esse e outros tablóides reproduzem. Assente no populismo, a sua agenda ideológica tem como alvo preferencial tudo o que seja público, com uma matriz de fachada sensacionalista. O discurso de extrema direita de ataque ao poder político, aos imigrantes, xenófobo e racista, é capaz de triturar seja quem for, em nome do status quo e da manutenção dos seus interesses económicos, num tempo em que se tenta, ou tentou, reduzir o Estado a uma mera função de garantia de segurança pública. O populismo tablóide exorta o definhar do Estado social, assim como se alimenta de escândalos julgados na praça pública. Adora Marcelo Rebelo de Sousa a comer tudo o que puder em qualquer balcão de um qualquer café do país. Nunca procura a verdade dos factos, porque o factual pode não servir os seus interesses, e não se coíbe de dar a sua própria opinião, ajuizando e influenciando antes do julgamento feito.
As frases que se vão ouvindo na rua 'Qualquer dia somos todos muçulmanos', 'ajudam estes terroristas e não ajudam os nossos que passam fome', 'não há nenhum político honesto', 'os apoios sociais só servem para os malandros não trabalharem', etc., são a reprodução fiel que o populismo tablóide explora e reproduz sem qualquer pudor. Apelidam de censura qualquer laivo de limitação da sua ação, mesmo que decidida por um juiz, mesmo que a sua ação viole as leis que ainda separam a liberdade de expressão da libertinagem de atentado aos direitos das pessoas.
Já aqui dei o exemplo do Correio da Manhã, mas outros há, aqui e lá fora. O jornal A Bola e alguns canais televisivos são desses exemplos, mais controlados alguns, mas sempre com os olhos postos na grande nação benfiquista, como mais recentemente, não se coibindo de pôr em causa a seriedade e o profissionalismo de Sérgio Conceição. A lama do futebol também é um espelho do país. Como em tudo.

Lá por fora, o tão aclamado Charlie Hebdo, como tão desconhecido que era, publicou um 'cartoon' onde prevê que Aylan Kurdi, o menino sírio de dois anos encontrado morto numa praia turca depois de tentar chegar à Europa com a família, iria tornar-se um abusador de mulheres quando crescesse. O 'cartoon' surge após revelações de agressões sexuais levadas a cabo por grupos de migrantes na noite de ano novo na cidade alemã de Colónia. E ilustra um Aylan, já adulto, com ar depravado, a correr atrás de uma mulher com a língua de fora e os braços esticados. Eis um exemplo de libertinagem xenófoba, que nada tem a ver com liberdade de expressão, mas tão só e unicamente procura o maior lucro possível à custa de passar por cima de qualquer princípio ou direito. Assim se tem feito na Europa dos últimos anos. Urge parar para pensar que sociedade queremos e que valores iremos transmitir aos nosso filhos para que não tenham que fugir ao mínimo vislumbre de uma pessoa que seja suspeita de poder ser muçulmana. O terrorismo tem várias faces e esta não é a melhor maneira de lhe responder. Tornar cada um de nós num potencial xenófobo ou racista. A não ser que isso já nos esteja no sangue. 


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