sábado, 30 de abril de 2016

42 anos depois

42 anos após o 25 de Abril, e rompendo com o sistema coxo do arco da governação, temos finalmente um Governo do PS suportado pelos partidos à sua esquerda, e que se atreve a ter uma política que rompe com o caminho do empobrecimento. A geringonça que funciona. Um governo que não faz a devida vénia e critica Bruxelas ao defender Portugal. Um Governo que já apresentou um verdadeiro plano nacional de reformas com reforço da coesão e igualdade social, e que não ficou na gaveta.
Perante as críticas da comissão europeia, nomeadamente quanto ao aumento do salário mínimo, temos finalmente um primeiro-ministro que não faz de criado, afirmando claramente que recusa um modelo de país baseado em baixos salários e que a batalha pela igualdade continua.
Temos finalmente um primeiro-ministro que diz: “a batalha pela igualdade é permanente, já a travámos antes do 25 de Abril de 1974 e temos de continuar a travá-la. Quando vemos alguns cá dentro ou na Europa a dizerem que em Portugal nós não nos desenvolveremos aumentando o salário mínimo nacional, porque estamos condenados a viver num país de baixos salários e de pobreza, temos de dizer que não aceitamos”. A isto chama-se defender Portugal e Abril.
O 25 de Abril é de todos, mas para não cair na tentação da hipocrisia, é justo dizer-se que alguma direita encara o 25 de Abril como uma coisa mais à esquerda, e de que esta se apropriou. Veja-se a forma como alguma direita encara o cravo enquanto símbolo do 25 de Abril como um símbolo da esquerda, daí a forma desengonçada como os sucessivos dirigentes dos partidos da direita o encaram, em particular, aqueles que chegam a Presidente da República. Cavaco nunca o usou, Marcelo exibe-o na mão e as fontes de Belém justificam a sua não colocação na lapela por ser um político do centro.
O facto de o cravo ser o símbolo da revolução deve-se ao facto de ser uma flor da época. Alguém se lembrou de colocar um cravo numa G3 e por uma feliz coincidência do destino um fotógrafo aproveitou para fazer uma bela imagem. Quem colocou o cravo na G3 não estava a fazê-lo por o cravo ser vermelho, era simplesmente uma flor que brotava de uma arma de onde seria de esperar que brotassem balas.
Portanto, nem o cravo é um símbolo da esquerda, nem o vermelho dessa flor era uma opção ideológica. O cravo foi um símbolo de uma tolerância que se tornou a imagem da revolução.
42 anos depois, a direita, na casa da democracia, fica desconfortável quando o presidente da Assembleia da República agradece aos capitães de Abril pelo 25 de Abril. Está desconfortável quando o Presidente da República, oriundo da sua área política, agradece aos militares pelo 25 de Abril e pela liberdade e pela democracia devolvida aos portugueses. Militares de Abril que regressaram à casa da democracia, após 4 anos de interrupção, enquanto por lá passou o governo neoliberal de Passos Coelho e de Paulo Portas. O primeiro que anunciou no último congresso do PSD o regresso à social democracia, que, portanto, tinha perdido, a matriz ideológica de Sá Carneiro e que até nasceu à esquerda, e o segundo que saiu de cena, espera-se, irrevogavelmente. Haverá alguém que acredite numa e noutra?
Mas 42 anos depois, temos mesmo uma democracia livre? Ou temos uma democracia a soldo dos grupos económicos, como no caso recente do GES em que se descobriu que a empresa de Salgado pagava avenças a políticos e jornalistas?
Uma democracia com o garrote dos poderes europeus e do diktat alemão que manda e desmanda na política de países soberanos seus parceiros, alimentado por uma direita subserviente aos jogos de casino e dos juros usurários.
Ficámos todos contentes porque nos deram a liberdade. Podemos dizer mal de quem nos apetecer. Mas, na verdade, após 42 anos, estão a reduzir-nos ao papel de idiotas votantes, manipulados na opinião a soldo, livres, sim, mas utilizados para caucionar uma democracia hipócrita em que meia dúzia reinam sobre os súbditos ululantes e explorados na quinta do capitalismo selvagem.

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