sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Um aperto de direita

O dogma do primado do mercado é finalmente posto em causa pela própria direita. A austeridade a qualquer preço, que representará em 2012 uma recessão de 2,6%, só a mais alta desde que vivemos em democracia e uma taxa de desemprego recorde de 13%, num pacote bem embrulhado de cortes de salários, reformas e subsídios. Um esbulho que irá custar entre 40% a 50% do rendimento disponível até 2013. Um radicalismo cego contra todos os avisos, incluido o de Cavaco, que agora é criticado quando antes era aplaudido. Porque é que o nosso plano de ajustamento não pode ir até 2015, como o da Irlanda?
A estratégia falaciosa da austeridade, com o consequente crescimento das desigualdades sociais, não leva a mais eficiência, mas a uma desagregação que seria catastrófica. Não quero parecer demasiado pessimista, mas o caminho que isto segue é o da destruição completa da nossa economia.
A direita mundial, após o fracasso do 'mercado livre', começa agora a reconhecer a importância do Estado-providência, mais intervencionista, moderador de desigualdades e zelador das igualdades. O dogma de que todos podíamos enriquecer pelo risco e pelo capital, tornou-se a quinta das galinhas dos ovos de ouro para meia dúzia de empresários e especuladores. Está à vista de todos que só alguns enriqueceram, e só esses poderão enriquecer ainda mais. Os outros que se seguem, são afilhados e protegidos pelo sistema. Os que sobram são contribuintes e indigentes. Os que pagam para que tudo fique na mesma.
A esquerda moderada não quer acabar com o capitalismo, não quer um socialismo soviético, quer um capitalismo com regras. A direita começa a reconhecer que um capitalismo selvagem sem regras, caminha a passos largos para a sua derrota.
O populismo do discurso liberal, é aproveitado pelos poderosos para manterem os seus privilégios. Se se fala na falta de fiscalização para pôr ou tirar uma dúzia de rendimentos sociais de inserção, já aos salários e mordomias de políticos e empresários salafrários, escrutinados todos os dias, nada acontece. E a diferença entre uns e outros é de milhões de euros no que aos cofres públicos concerne. Como me dizia um amigo meu, nem 8 nem 80.
A diferença está pois no que o sistema político faz assim que chega ao poder. Entre a esquerda e a direita, ainda ninguém conseguiu governar contra o grande capital, que oferece empregos de administração pagos principescamente a quem sai do governo e deu uma mãozinha. Note-se que o capital e o património continuam a não ser tributados à medida da subida dos impostos sobre o rendimento e o consumo.
Tanta falta de visão, tanta austeridade suicida, tantos cortes, uma desvalorização salarial fortíssima, acompanhada de facilitismo de despedimentos e quebras de investimento e de consumo como não se viam desde os anos 80, e teremos uma economia competitiva do género da China na Europa, mas só à base de mão-de-obra barata e de um Estado pequenino, sem centros de decisão e vendido pela oferta mais baixa a quem quiser comprar.


terça-feira, 18 de outubro de 2011

O combate do século

Pedro Passos Coelho é um desportista fantástico, um atleta profissional de alto gabarito, com uma direita poderosa e um estilo moderno e liberal, não é nada fácil de derrubar. O boxe que pratica é de alto rigor técnico, transformando-o num dos melhores da actualidade na sua categoria.
Aliado a isso, ter como agente Miguel Relvas, que lhe assegura uma estratégia de combates mais ou menos fáceis, intercalados com um ou outro do seu nível, permitiram-lhe assegurar a posição de imbatível nos dois últimos anos. O treinador, Ângelo Correia, é uma raposa velha, habituado à lide, ex-boxeador e levou o seu pupilo ao colo até ser o primeiro. O saco que utiliza é da marca Vítor Gaspar. Muito resistente e maleável.
No combate com Ferreira Leite, Passos nem precisou de 2 rounds, basicamente a estratégia do seu agente e do seu treinador garantiram-lhe a vitória.
O combate com Sócrates, foi o mais difícil da carreira até ao momento, mas mais uma vez a estratégia dos seus homens-sombra foi fundamental. Negaram a Sócrates o combate até este estar desgastado... Deixaram que Sócrates combatesse primeiro com os canhotos, Jerónimo e Louçã. Aproveitando o momento, num combate assente em falsas premissas (o combate ficou para a história como o PEC IV), Passos derrubou um Sócrates visivelmente desgastado ao terceiro round.
Passos Coelho chegava a primeiro, após uma intensa preparação de anos a fio. O seu treinador finalmente tinha um número um.
A seguir veio o murro no estômago que levou Passos ao tapete pela primeira vez. A agência de rating Moody's é um opositor feroz, que já tinha derrotado Sócrates, mas desta vez o promotor e ex-boxeador Cavaco ajudou Passos a voltar ao ringue, mais feroz que nunca.
A seguir veio a segunda ida ao tapete. João Jardim, um veterano, experiente e sabido atacou o ponto fraco de Passos, o estômago, mas Passos conseguiu recuperar. Copiando o estilo de Cavaco, conseguiu passar incólume, deixando a João Jardim o título regional.
Foi então que os homens de Passos lhe arranjaram um combate mais fraco, no entanto muito mediático, para Passos voltar à ribalta. Seria contra a classe média portuguesa. E ao fim do primeiro round já Passos tinha dado três murros no estômago e um gancho de direita bem no meio do nariz da indefesa e descuidada classe média. A mesma que até tinha apoiado Passos no combate contra Sócrates.
Vem aí no entanto, um combate bem mais duro, o Povo. A princípio diziam que era brando, mas isso revelou-se um logro, mais uma estratégia para o tentar diminuir. No entanto, o Povo começa a ganhar músculo, inteligência e já não se deixará enganar pelos ganchos de direita de Passos. Os próximos combates do Povo, contra a Troika e contra Passos serão decisivos. Ou o Povo regressa a número um onde já esteve, ou é derrotado e termina a carreira. Eu aposto no Povo. Mas aposto pouco.





quinta-feira, 13 de outubro de 2011

A Justiça que temos é a que nos dão

A Justiça em Portugal é um dos maiores problemas que urge resolver/reformar. Tudo o que foi feito após 25 de Abril de 1974 foram catadupas de remendos que se tornaram banais. É como uma ferida que não sara e sobre a qual é aposta penso sobre penso, às vezes retirando um usado e colocando outro, como um cartão de sócio de um qualquer clube, em que se colam quotas sobre quotas, sem remover as anteriores. Preguiça, comodismo. Acrescente-se à Justiça a falta de visão, por tal não ser o caso do exemplo do inocente cartão de sócio.
Á amálgama (orgias para usar uma expressão muito em voga) de legislação diária, juntam-se os interesses de quem não quer que o sistema mude. Assim, o legislador vive do expediente diário da vida política, o tapar de buracos (outra expressão da moda) é o dia-a-dia de qualquer deputado, assessor ou governante. A falta de uma visão estratégica para vigorar 30 ou 40 anos. A falta de coragem e o populismo imediato que impede uma verdadeira reforma contra os interesses instalados mas a favor do cidadão. O remendo usa-se para durar uns meses e quem vier a seguir que feche a porta.
O Ministério Público refugia-se no sindicato, e os Juízes no Conselho Superior. Nenhum deles cumpre prazos porque a isso não são obrigados. São independentes e acima de qualquer suspeita. São cidadãos com uma auréola de verdadeiros deuses. Não todos como é evidente. Os Advogados usam de manobras dilatórias para atrasar os processos? Sim, às vezes. Mas só quando a lei ou o Juiz permitem. Se não o permitirem, a dilação não pega nem pode ser usada.
Tudo isto a propósito do caso Isaltino Morais. A lei permite mais dois 'recursos'. Não lhe pode ser humanamente exigível que não os utilize. Os juízes têm prazo para julgar os recursos? Não. Já devia estar preso há muito tempo? Provavelmente. Foi detido indevidamente há uma semana? Vergonhosamente. Tudo a fazer lembrar outros casos do passado e em que se prova que ninguém aprende nada neste país. Num país pequenino de egos enormes, tudo é feito ao sabor do imediatismo mediático, dos minutinhos de fama, dos donos da verdade, e das almas preenchidas de atenções vazias de sentido.
A Justiça em Portugal é assim, ao sabor do vento, das classes e corporações, do mediatismo, do déspota que tudo sabe, do chico-esperto que tudo fura, e da justiça aplicada a metro.
Esta semana já ouvi e li a Ministra da Justiça actual e uma outra anterior falar da urgência de acabar com as manobras dilatórias na Justiça. Tudo a reboque do presidente de Oeiras. Obviamente que o fundo da questão é o medo, o perigo, o terror, o papão chamado prescrição criminal.
Quando se fala em prescrição de crime, é preciso saber que tal é uma garantia Constitucional. Os fins das penas, de prevenção, e de punição, apenas se justificam num espaço temporal em que a sociedade e o meio façam depender que um qualquer individuo prevaricador seja punido. Não se justifica que alguém seja punido por um crime de furto ocorrido há mais de 30 anos, quando na altura até só tinha 18. Já foi esquecido, e a pessoa também já não é a mesma. Já um caso de homicídio será diferente, mas por isso é que os prazos de prescrição também variam. Sem contar com as interrupções e suspensões da prescrição que agora seria maçador tentar explicar, para mim e para quem eventualmente estiver a ler.
O que verdadeiramente enerva é que uma já lá esteve e nada fez, falo de Celeste Cardona, a outra nunca se teria lembrado de tal, como não se lembrou durante a campanha ou no programa do governo, se não viesse a reboque de um caso mediático. Se fosse um caso parecido, mas em que o arguido se chamasse Zé Sempre em Pé, ninguém falava em manobras dilatórias por estes dias. Aposto 10/1 em como nada será feito também nesta legislatura.
Muito mais ficou por dizer, nomeadamente da promiscuidade entre o MP e o Juiz, que quase trabalham juntos, e partilham muitas vezes o mesmo espaço. Não defendo o sistema americano, mas aqui eles têm toda a razão. Fica para outra oportunidade.


quinta-feira, 6 de outubro de 2011

A diplomacia cobarde da Palestina

A história dos dias é muito comprida, mas vou tentar resumir em poucas linhas séculos de história, com todas as óbvias imprecisões que daí possam resultar.
As raízes do conflito Israelo-Palestino remontam aos fins do século XIX quando colonos judeus começaram a migrar para a região da Palestina. Sendo os judeus um dos povos do mundo que não tinham um Estado próprio, tendo sempre sofrido por isso várias perseguições, puseram em marcha o projecto sionista - cujo objectivo era refundar na Palestina um estado judeu onde antigamente ficava o reino de Israel, conquistado pelo império Otomano. Entretanto, a Palestina já era habitada há séculos por uma maioria árabe. Com a chegada dos judeus, as tensões começaram a surgir. Após vários Acordos e Conferências, em 1922 a Liga das Nações atribuiu a soberania da região ao Reino Unido, que, por sua vez em 1947, não sabendo e não querendo resolver o conflito que continuava latente com massacres e atentados dos dois lados, abandonou a região.
Em 1947, a recém criada ONU, através da resolução 181, propôs a criação de dois Estados independentes na Palestina. Em 1948, a Agência Judaica proclamou a independência de Israel. Nesse mesmo ano, a Síria, o Egipto, o Iraque, a Jordânia e o Líbano invadem a Palestina, com o argumento de que as populações são na sua maioria árabes e que o Estado de Israel é ilegal, assim como a resolução da ONU. Com o fim da luta armada, Israel passa a controlar metade da Palestina, a Jordânia controla a Cisjordânia e a Faixa de Gaza é controlada pelo Egipto. Até 1967... em seis dias, (daí a Guerra dos Seis Dias) Israel invade a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, os Montes Golã e Jerusalém oriental, alargando e reocupando esses territórios, resultando daí milhares de refugiados. Nasce então a OLP (Organização para a Libertação da Palestina), todos se lembram de Arafat e da Autoridade Palestiniana, das intifadas, das resoluções da ONU constantemente violadas por Israel, de Rabin, Netanyahu  e Sharon e dos inúmeros acordos e negociações de paz, falhados.
Na semana passada, a Fatah reclamou nas Nações Unidas um Estado para a Palestina. Só que para isso ser solução precisa de um Governo legítimo e legitimado nas urnas, tribunais independentes e imprensa livre. A Fatah e o Hamas estarão em condições de o garantir? Duvido. Israel tem direito à sua defesa e segurança? Tem. Mas o sistema de defesa de Israel, assente na colonização da Faixa de Gaza e da Cisjordânia não facilita o processo.
Portugal foi eleito para o Conselho de Segurança da ONU, eleito em grande parte pelos países árabes e com o voto contra de Israel. Quisemos lá estar para podermos ter influência e voto na matéria, certo? Portas e Passos Coelho disseram nim ao processo. Ou seja, Estado da Palestina sim, desde que negociado com Israel, ou seja nas condições que eles impuserem. Os americanos assim o disseram, os cordeiros vão atrás. Israel impõe mais uns quantos colonatos, e já têm base para negociações por mais 40 anos. O único Estado palestino que Israel reconhecerá será um território de 50 Km2, na faixa de Gaza, rodeado por um muro de 30 metros de altura e cercado por canhões. Se a Palestina não tem direito a Estado na sua própria terra são o quê? Apátridas? Obama recuou, e com ele toda a margem de negociação ficou limitada à vontade de Israel. Os EUA continuam a ter uma visão mercantilista do conflito, apoiando Israel no controlo do Médio Oriente e claro do petróleo que lhe está subjacente. O lóbi pró judaico-americano continua também a ditar regras sobre todos os presidentes norte-americanos, e ainda não houve nenhum que não se acobardasse. As generosas contribuições dos judeus nas campanhas eleitorais americanas assim o ditam. Judeus e cristãos fanáticos que acreditam que Israel é a linha da frente do combate contra o Islão. A UE continua a não ter uma voz única e influente, distraída com as tiradas económico-colonialistas de Merkel. Se acha que Estados europeus deviam perder soberania, muito menos aceitará atribui-la à Palestina. A nova Alemanha com vícios antigos...
A resolução do conflito só se fará quando os EUA quiserem, ou quando a UE tiver voz respeitada e influente. Com dois Estados independentes na região. Não será no meu tempo...